terça-feira, 19 de março de 2013

ENTENDENDO O PROBLEMA DA UNILEVER COM O ADES E UM ESCLARECIMENTO SOBRE AS BEBIDAS DE SOJA DO MERCADO




           Estes dias tenho visto circular piadinhas nas redes sociais a respeito do recall anunciado pelas indústrias UNILEVER do lote de produção TBA3G das bebidas de maçã a base de soja da marca ADES de embalagens de 1,5 litro, vamos esclarecer os fatos à luz da razão.

Este lote foi produzido na fábrica de Pouso Alegre (MG), e foi constatado contaminação com solução de higienização das embalagens, sendo que, segundo a assessoria de imprensa da empresa, 96 embalagens foram envazadas com esta solução e poderiam provocar queimaduras nas mucosas, e por isso a empresa imediatamente solicitou o recolhimento deste lote no Mercado.

            Mesmo com o recall, há registro de 14 casos de consumo deste lote contaminado, e a ANVISA, cumprindo o seu papel de proteção a saúde da população contra consumo de produtos considerados impróprios, solicitou a suspensão da fabricação, distribuição e comercialização de todos os produtos da linha ADES, até que a unidade fabril de Pouso Alegre (MG) seja inspecionada pelos técnicos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária e seja constatado a confiabilidade nos controles de produção e qualidade desta linha de produtos para que ocorra a sua liberação.

            Não há dúvidas que uma empresa com a reputação e responsabilidade do porte da Unilever irá reparar quaisquer danos causados e irá atender integralmente a legislação do código de defesa do consumidor, e que o problema que ocorreu foi decorrente de uma falha pontual das boas práticas de fabricação neste lote específico, causado por erro humano.

          O que está em jogo aqui, e por isso a repercussão em larga escala, é que estamos falando da segurança da saúde da população, vale lembrar dos lotes de anticoncepcionais de farinha da Marca MICROVLAR produzidos pelos laboratórios Schering que se fizeram circular em 1998, também devido a uma falha humana no controle de qualidade da produção, portanto, não importa o quanto a empresa assuma suas responsabilidades, o dano já foi causado. Por sorte em nenhum dos dois casos tivemos mortes. No caso da Schering, ela foi responsável por um insignificante aumento populacional, e no caso da Unilever, 14 pessoas sofreram danos considerados leves.

         Não há dúvidas de que a UNILEVER é uma instituição secular e uma empresa respeitada globalmente, entretanto, do ponto de vista dos impactos causados à reputação da empresa e da marca, dos prejuízos causados para esta linha de produtos no Mercado, nós somente poderemos medir no longo prazo, e vai depender de quão urgentemente, severamente e assertivamente a UNILEVER vai resolver este problema, independente destes impactos, posso afirmar com segurança que a empresa muito brevemente irá retomar a produção e comercialização desta linha de produtos no Brasil e irá recuperar uma boa parte de seu público consumidor, e a profundidade dos arranhões na reputação da marca será medido pela resposta do Mercado.

          Para o pessoal da UNILEVER que cuida da gestão estratégica de marcas no Brasil, este problema poderia se transformar em uma ótima oportunidade de reformular totalmente o produto em sua qualidade nutricional, oferecendo para o mercado um produto melhor e superior, e lançar uma campanha nacional massiva para informar esta mudança, uma vez que o produto original irá sofrer danos irreparáveis para a sua reputação, e já que a empresa está na eminência de perda expressiva de sua fatia de Mercado neste seguimento para seus concorrentes, esta mudança poderia representar uma estratégia de “blindagem” do market share desta linha de produtos.

APROVEITANDO O DESTAQUE DESTE TEMA, VAMOS DISCUTIR A QUALIDADE NUTRICIONAL DAS BEBIDAS DE SOJA DO MERCADO

             Antes de falar sobre a qualidade das bebidas de soja, vamos falar sobre a função destas bebidas para a dieta da população.

          Para nossa sociedade contemporânea, do consumo rápido e estilo de vida cada dia mais dinâmico, o leite de vaca principalmente, e suas bebidas lácteas derivadas, representam uma fonte rápida, prática e segura de obtenção de parte dos nutrientes essenciais das necessidades diárias de uma pessoa, e devido ao aumento da incidência de fatores alérgicos na população e também devido a popularização dos apelos saudáveis do consumo de derivados da soja, as bebidas de soja acabaram por ocupar um nicho importante do mercado como substituto alternativo do leite e das bebidas lácteas.

            Nestes termos, devemos destacar que os principais nutrientes que obtemos do leite de vaca vão além dos macronutrientes proteína, gordura e carboidratos, devemos nos preocupar também com os minerais e micronutrientes para os quais o leite representa uma das principais fontes da alimentação contemporânea: o cálcio, o fósforo e as vitaminas A, C, D e do complexo B.

            Vamos discutir primeiro a importância das proteínas do leite, este é constituído basicamente por caseína (80%) e proteínas do soro (20%), estes dois tipos de proteínas são de fácil digestão e de rápida absorção, e fornecem todos os aminoácidos essenciais que nosso corpo necessita.

            Já em termos de composição mineral, um copo de leite pode ser responsável por uma parte considerável do suprimento dos principais minerais de nossa nutrição, e de acordo com a Tabela Brasileira de Composição dos Alimentos, um copo de leite semi-desnatado de 200 ml pode fornecer cerca 23,9 mg de magnésio (9% do VDR), de 368 mg de fósforo (53% do VDR), 300 mg de cálcio (30% do VDR), 0,8 mg de zinco (11% do VDR), 66 µg de vitamina A (11% do VDR), 0,3 mg de riboflavina (23% do VDR), 0,1 mg de tiamina (7% do VDR), 0,17 µg de vitamina D (3,4% do VDR).

            Levando em consideração o aspecto das proteínas, uma formulação de bebida de soja para equivaler ao valor nutricional do leite de vaca e substituí-lo adequadamente na dieta do consumidor, deverá ser constituído de proteína isolada da soja de alto valor biológico, para garantir que em concentrações próximas à de proteína presente no leite de vaca, o aporte de proteína seja equivalente e tenha a mesma qualidade de digestão e absorção. Sendo assim, formulações de bebidas de soja com concentrações inferiores a 5 g/ 200 ml de proteína isolada da soja ou que contenham extrato de soja no lugar da proteína isolada da soja, são inadequadas para substituir o leite de vaca como alimento equivalente.

            Porque o extrato de soja não é adequado para a nutrição como substituto do leite de vaca e a proteína isolada da soja é adequada e equivalente? Por dois motivos, o primeiro é que o extrato de soja não tem a mesmo valor biológico da proteína isolada da soja em termos de digestão e absorção, o valor biológico do extrato é muito inferior ao da proteína isolada, o que prejudica seu aproveitamento nutricional, e o segundo motivo, é que o extrato de soja ainda pode conter traços de fitatos que são substâncias desmineralizantes presentes na soja, que podem contribuir com a perda de minerais ou dificultar a absorção destes em nosso organismo, já a proteína isolada da soja, devido ao seu processamento para sua obtenção, praticamente elimina a presença dos fitatos.

            Já em relação a presença de minerais e vitaminas na formulação da bebida de soja, é necessário que esta atenda a equivalência mínima da composição do leite de vaca para oferecer os mesmos benefícios nutricionais.

            Observando as bebidas de soja que temos disponíveis nas prateleiras dos supermercados, praticamente a grande maioria delas é fabricada a partir do extrato de soja, ou seja, são inadequadas do ponto de vista do valor biológico das proteínas e de sua concentração, quando comparadas com o leite de vaca e a sua equivalência nutricional. São raras as marcas que oferecem a formulação com proteína isolada da soja (são três no total), sendo que duas apresentam formulação com mais de 5g de proteína para 200 ml, e uma apresenta formulação com menos de 5 g de proteína por 200 ml.

            Do ponto de vista de composição de minerais e vitaminas, a maioria das marcas oferecem apenas uma formulação parcial quando comparadas a equivalência com o leite de vaca, e apenas três marcas de fato conseguem oferecer uma composição mineral e de vitaminas 90% próximo da formulação do leite de vaca.

            Quando combinamos estes dois fatores, qualidade e concentração da proteína isolada da soja e a composição mineral e vitamínica, apenas uma marca que é comercializada nos supermercados atende a equivalência nutricional quase completa quando comparado com o leite de vaca.

            Espero, que com estas informações, os leitores possam se conscientizar e avaliar melhor os rótulos dos produtos que consomem, principalmente em relação ao consumo em larga escala das bebidas a base de soja, e realizar comparações, para se certificar que estão levando para suas mesas o produto mais adequado em termos de qualidade nutricional.

            Esta dica de observar o rótulo serve para todos os produtos que consumimos no nosso dia a dia para que possamos ser consumidores a cada dia mais conscientes.

             E desejo que o conteúdo deste texto também possa vir a ser útil para as pessoas que administram as empresas fabricantes de alimentos, para se conscientizarem que a indústria de alimentos no Brasil venha a ser de fato comprometida e engajada em oferecer para o público consumidor cada vez mais opções de produtos com melhor qualidade nutricional e menos apelos vazios de marketing.


Por Lecio Fernandes Valencio Junior
Coaching do Bem-Estar